sábado, 4 de outubro de 2008

leninha

Um comentário:

caetano trindade disse...

Lá na Brejaúba conheci um candieiro que me contou a sua história (acho que deveria escrever estória, porque afinal, candieiro não merece ter uma História). O nome dele completo vocês saberão no final do livro, mas ele é conhecido como Tim.
Tim é um menino franzino que já aos cinco anos busca cavalo no pasto e prende bezerro. De cavalo ele entende muito, apesar da pouca idade. Alguns dizem que tamanho não é documento, todavia para Tim, tamanho poderia ter evitado uma fratura no braço. Montado no cavalo em pêlo, ao abrir a porteira, faltou-lhe perna para se equilibrar no lombo do “alazão”, o resultado foi um braço quebrado. Para a sua compensação ficou sem trabalhar mais de 30 dias com o braço enfaixado, além disto, “ganhou” uma viagem para Barbacena, porque em Cipotânea não engessava e nem engessa braço quebrado. Ficou feliz ao ir na Santa Casa lá em Barbacena, andou de ônibus e até viu um trem de ferro apitando, soltando fumaça esquentando o frio gelado da Serra da Mantiqueira.
Estas férias forçadas foram boas, mas terminou, e a rotina voltou tudo de novo: dos cinco aos sete anos menino não vai a escola, pode ajudar em casa, como descascar e debulhar milho, tratar de porco, prender bezerro e é claro já iniciar na profissão dos próximos duros anos: candiar boi. Tim gostava de estar perto de bois. Ajudava os seus irmãos a amansar os bezerros. Boi não nasce sabendo puxar carro, é preciso ser treinado. E quanto mais cedo começar, melhor. Assim como um candieiro. Os bezerros ganham logo um nome. Eles não têm certidão de nascimento, mas todo mundo conhece os bois pelo nome. A primeira junta de boi que Tim ajudou a amansar se chamava Bordado e Ramim. Ramim era um boi espantado que ao ver o candieiro ir buscá-lo no pasto, saía correndo como um relâmpago pelo pasto afora, até pulava a cerca e se escondia no matagal de alecrim e achapêche. Não tinha moleza, o candieiro tinha que tocar os bois até o curral para o carreiro (homem adulto de mais de 12 anos de idade que é responsável pelo carro de boi).
A carga mais comum transportada naquela época era o milho. O transporte da roça para o paiol. Muitas vezes a viagem durava mais de 3 horas. Em um dia se fazia umas três viagens, ou seja, o candieiro tinha que andar mais de 20 km por dia guiando os bois. Ao contrário, o carreiro passava a maior parte do tempo montado no cabeçalho do carro. No entanto, toda a responsabilidade era do carreiro que tinha além de guiar os bois de coice e tocar os bois de guia, cuidar para que o candieiro fosse constantemente xingado. Além de estar atento para o carro não queimar o eixo onde o chumarro encosta na cheda, não deixar que a roda não coma o fueiro e ter cuidado para o carro não tombar em meios a cupins, pedras e tocos de pau.
Na longa viagem na frente dos bois, o Tim ocupava seu tempo olhando de vez em quando para trás para verificar se estava tudo em ordem e tomar a distância suficiente para que o Mimoso (boi de guia) não chifrasse sua bundinha
Ex-Candinheiro | 08.12.07 - 2:08 pm | #
________________________________________
Um candieiro: seus sonhos e desafios

Já no início deste curto capítulo, vou logo definindo o que é um candieiro. Se você tiver acesso à internet e um pouco de curiosidade verá que nada se encontra quando se digita a palavra candieiro em uma das várias ferramentas de busca virtual. É isto, eu acho que candieiro não significa mesmo muita coisa, e até acho que isto é coisa para criança de 5 a 12 anos. Para os moradores de Cipotânea e cidades vizinhas, candieiro é um menino (em raras exceções meninas) que anda na frente dos bois na canga para guiá-los. Portanto, diria que candieiro é uma profissão para crianças. Sendo assim, homem grande que candeia boi é homem preguiçoso ou homem que nunca teve promoção na carreira.
As pessoas que moram na cidade (como por exemplo Cipotânea) não tinham muita idéia do que era um candieiro. A partir da primeira festa do milho em Cipotânea, a carreira infantil desconhecida tornou-se motivo para festejar. O candieiro ganhou destaque, lá estava ele na frente dos bois pelas ruas afora durante o desfile de carros de boi. Lá estão os meninos de pernas curtas com chapeuzinho na cabeça e quichute nos pés. Ao mesmo tempo, os candieiros continuam injustiçados, porque quem brilha e até ganham prêmios são as rainhas do milho. Meninas de rostos bonitos e lindos vestidos, enfeitados com ornamentos da planta do milho.
Para falar a verdade, a profissão do candieiro ainda é completamente desconhecida, até mesmo pelos organizadores da famosa festa do milho. E até hoje, até onde sei, nada há de escrito sobre esta profissão de crianças. Tentarei neste capítulo ser o mais fiel possível com a realidade desta profissão, usando palavras que não se encontra no Aurélio, muito menos em outra língua estrangeira. Tentei explicar para um colega alemão o que é um candieiro, fiz um esforço tremendo para que ele pudesse ativar sua fantasia e entender esta profissão. Depois de conversarmos mais de meia hora ele concluiu dizendo: “Candieiro é uma profissão para iniciantes. É o menor cargo que se pode assumir lá em Cipotânea, não é verdade?”. É isto, talvez ele tenha me entendido. Mas para minha surpresa, minutos depois ele me perguntou: “Trabalho infantil no Brasil é legal?”. Novamente, ele tinha razão. Trabalho infantil é ilegal, também no Brasil.
Não estou aqui para defender direitos humanos, para isto existe até profissionais formados. Mas eles, estão sempre ocupados lá na cidade grande cuidando dos problemas grandes. Os candieiros, são desconhecidos, não merecem a atenção nem da professora do pré-primário, muito menos do pessoal dos direitos humanos.
Hoje em dia tem até trator em Cipotânea, mas o principal meio de transporte de carga é ainda o carro de boi. Sobre o carro de boi também não existem muitos escritos, mas é uma coisa antiga trazida pelos nossos colonizadores, os portugueses. Lá na Brejaúba conheci um candieiro que me contou a sua história (acho que deveria escrever estória, porque afinal, candieiro não merece ter uma História)

Quem sou eu